quarta-feira, 16 de novembro de 2011

3. Análise crítica e semântica do Decreto-Lei n.º 98/2011, de 21 de Setembro.

A abordagem tem implicações com matéria que está contida no normativo indicado no título, e se prolonga nos artigo do Secretário de Estado do Desporto e Juventude, “Pelo futuro da juventude portuguesa” (in Público, 09.11.2011), e mais recentemente, “Jovens: citius, altius, fortius” (in Expresso, 12.11.2011), pautados pela banalidade, sem a força da comunicação que é a marca da liderança.


O primeiro artigo apoia-se na metodologia da Comissão Europeia, autora de muitos Livros Brancos, e que serve de pretexto para lhe seguir as pisadas e elaborar igualmente um “Livro Branco para a Juventude” que, no quadro social actual de incerteza, deterioração política, económica e comunitária, é o que a Juventude menos necessita.


O segundo artigo reincide na força do “Livro Branco da Juventude”, e porque carece de argumentação que dê consistência à sua formulação, socorreu-se do glossário olímpico que é a marca do desporto, o velho lema “citius, altius, fortius”, criado pelo Padre Henri Martin, que sugeriu a sua incrustação numa lápide, por cima da porta de entrada do Albert Le Grand School, adoptado por Coubertin para o COI, e tornado extensivo aos profissionais olímpicos por Samaranch.


Para lhe dar a força que não tem inculca o ideário no GOP: “Governo espoletou um Livro Branco da Juventude, num processo envolvendo o contributo de todos os agentes e destinatários das políticas de juventude em Portugal.”


No Decreto-lei n.º 98/2011, de 21 de Setembro, para justificar a coligação da juventude com o desporto, o preâmbulo cola-se aos instrumentos jurídicos da União Europeia, e às Cartas do Conselho da Europa, e da UNESCO, e finalmente do Comité Internacional Olímpico que, para o efeito, não têm nem apresentam qualquer relevância justificativa para enfatizar a união ou ligação de ambos signos, porque o relevo dado a tão parca questão apaga o essencial das realizações que se desejam para o Desporto e para a Juventude, separados, juntos, acoplados ou geminados, que importa isso ?


Mas vamos à génese dos Livros Brancos e Verdes em que a Comissão Europeia é pródiga, e averiguemos das suas utilidades.


No portal da União Europeia, enquanto a Europa se vai afundando com os problemas que levantou debaixo dos pés, e não os consegue resolver, poderemos assistir, paradoxalmente, à publicação de inúmeras bíblias, desde 1985 até hoje, designadas por Livros Brancos, que se debruçam sobre todos os problemas que atormentam a humanidade e se destinam a ocupar o tempo de ócio dos eurodeputados, para os redigir, divulgar e arquivar, para memória futura.


Não se pretende especificar os temas abordados, porque estão aí para quem os quiser consultar, mas reavivar a memória para os produzidos em 2007:

Desta trilogia destaca-se que na saúde e na nutrição se inscreveu o ontológico cuidado “estratégico”, mas no Desporto foi omitido porque já toda a gente reconhece, ou que o estratégico faz parte do corpus desportivo, ou porque chegaram à conclusão de que afinal o Desporto vem fazendo o seu caminho, mesmo com Livros em Branco, ou sem Livros Brancos. E não será difícil entender agora como nos curricula dos programas das Faculdades do Desporto, começou a entrar a disciplina “Saúde”, sob o pretexto de combater a “Obesidade”, tema que mereceu de John Evans, da Universidade Loughborough (UK), no artigo «Physical Education and health: a polemic or ‘let them eat cake’», o seguinte resumo:


“Este artigo analisa criticamente a "pesquisa obesidade", oferece uma maneira de lê-lo e sugere que muitas das suas afirmações, no melhor dos casos, são as mais exageradas, e na pior das hipóteses infundadas e, ironicamente, se traduzidas acriticamente, possa lesar, nas escolas, os interesses educativos, e de saúde, das crianças e dos jovens.”(in European Physical Education Review, vol. 9 (1):87-81 – Sage Publications, London. 2003)


Em 2001 a EU lembrou-se do tema juventude e deu à luz o Livro Branco, titulado Um novo impulso à juventude europeia. Noutro sítio é considerado como o Livro Branco da Juventude.

Para dar um pouco de luz à génese dos Livros Brancos o próprio Glossário da CE esclarece que:


“Os Livros Brancos publicados pela Comissão são documentos que contêm propostas de acção comunitária em domínios específicos. Surgem, por vezes, na sequência de Livros Verdes, cuja finalidade consiste em lançar um processo de consulta a nível europeu. Quando o Conselho dispensa acolhimento favorável a um Livro Branco, este pode dar origem a um programa de acção da União Europeia no domínio em causa.”


Repare-se como se decide na Comissão Europeia ao referir, na última linha, que “um Livro Branco… pode dar origem a um programa de acção da União Europeia”, donde se subentende que também pode dar origem a nada, mesmo depois de”acolhimento favorável”. São os destinos dos Livros Brancos.


E, relativamente aos Livros Verdes redigidos desde 1984, informa o mesmo Glossário:


“Um Livro Verde é um documento consultivo publicado pela Comissão, consagrado a um determinado tema e que se destina a recolher as opiniões dos meios interessados sobre um determinado número de questões. O Livro Verde visa permitir à Comissão determinar melhor as orientações futuras da sua política sobre o tema em questão.”


Em Julho de 2009, aparece um Livro Verde - entre os publicados desde 1984 - que opta pela Promoção da Mobilidade dos Jovens para fins de Mobilidade, e esgota-se a Juventude.

Esta obsessão pelos Livros Brancos, ou coloridos, é manifesto na lei orgânica da Secretaria de Estado do Desporto e Juventude, e serve de talismã para calar a sociedade civil que constantemente aponta o dedo aos Governos de nada fazerem, e estes vêem-se na obrigação de abrir um Livro Branco. E depois de publicado, a sociedade civil cala-se, fica na expectativa, para ver no terreno a sua realização, mas o tempo de espera esgota-se e a sociedade civil acaba por se esquecer, e o documenta arquiva-se para que o futuro indague se aquilo teve pernas para andar ou se ficou pela impressão e divulgação.


De resto, já temos o exemplo de uma espécie de Livro Branco encomendado pelo ex-Ministro da Juventude, Couto dos Santos, ao sociólogo José Machado Pais, com o títuloJuventude Portuguesa: Situações, Problemas, Aspirações, editado em 1989, pelo Instituto de Ciências Sociais, incluído numa colecção de sete volumes, dos quais se falará mais adiante, e que o actual governo possivelmente desconhecerá.


Desperdiçamos o nosso trabalho e o nosso tempo, apesar de considerarmos que a vida é curta e que o tempo é dinheiro. Com a agravante de ter que se falar do desperdício, em obediência ao dito de Camus: "As pessoas que não gostam de futebol obrigam-me a falar dele".


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