quarta-feira, 30 de novembro de 2011

6. Análise crítica e semântica do Decreto-Lei n.º 98/2011, de 21 de Setembro


Ainda que possa parecer excessiva a longa lista de instituições e organismos chamados a colaborar na elaboração de mais um Livro Branco da Juventude, independentemente da intencionalidade de o Governo pretender transmitir o volume de trabalho que vai encetar, a sua exposição, de exaustiva, cria uma responsabilidade redobrada, com o risco da desilusão no termo da empresa, se não corresponder aos intentos governativos que se desconhecem, já que desconhecida foi a escolha perante a crise política, económica e social, com graves problemas a enfrentar e resolver, e perante as arruadas e manifestações da Juventude que certamente anseiam tudo menos um Livro Branco da Juventude.

A primeira parte do preâmbulo – ocupando os parágrafos 5.º a 9.º - do Decreto-Lein.º 98/2011, de 21 de Setembro, constituem avisos sérios a todos os institutos e organismos da longa lista sobre o que os espera e cujas medidas não serão muito animadoras, inclusive a da eliminação de um ou outro, além dos tremendos cortes financeiros, e de novos desempregos. No quadro negro que a sociedade vive, é visível toda essa engrenagem trituradora nos referidos parágrafos.

Estes avisos preambulares contrastam com a Mensagem do Secretário de Estado do Desporto e Juventude, abordando a catalogação atribuída à juventude - “geração rasca”; “geração à rasca”; “geração do desenrasca”; “geração Sandwich”; “geração casinha dos pais”, esquecido, ou ignorando, que são criadas pela própria Juventude que assim se sente retratada, e não pela sociedade civil, daí as auto-denominações.

E nesta sequência enganosa, com palavras esgotadas e desbotadas pelo tempo, critica e considera que essas

“…conotações negativas e mensagens derrotistas de nada servem. Pelo contrário: alimenta, nos Jovens e em quem os rodeia um diagnóstico negro, um cenário de inevitabilidade, um défice de auto-estima, uma falta de crença na mudança,”

O que permite perguntar se as mensagens que se extraem dos parágrafos 5.º a 9.º do Decreto-lei n.º 98/2011, de 21 de Setembro, serão mais animadoras e permitirão qualquer “crença na mudança”, ou criar um superavitário de “auto-estima”. Não vale a pena enfatizar esta dupla linguagem contraditória entre o que se escreve no preâmbulo do normativo, e o que se lê na Mensagem. Falta uniformidade e equilíbrio na orientação governativa, donde não se vislumbrar qualquer resposta utilitária no Livro Branco para uma Juventude que só vê um quadro bi-falante, contraditório. E perante este cenário assevera que “Não é essa “a onda” deste Governo.”  Porque serão alterosas?

Posto isto importa perguntar se pode haver alguma assertividade nesta frase crédula posta na Mensagem: “…acreditamos na mudança, e estamos firmemente convictos de que os Jovens são causa e agentes decisivos dessa mudança.” A resposta é não, mas é o olhar do poder que contrasta com o olhar da sociedade civil jovem atingida pela peste negra das políticas em declínio.

Que ambos documentos – preâmbulo do Decreto-lei e Mensagem – não se harmonizam nem compaginam. E por uma razão muito simples. No normativo de 21 de Setembro, preambula-se o quadro pouco simpático do futuro para a juventude e o desporto, e quarenta dias depois, em 1 de Novembro, o Secretário de Estado do Desporto e Juventude esqueceu-o e escreveu uma Mensagem no Portal do Livro Branco, para a Juventude Portuguesa – que é republicada no Público de 9 de Novembro – reanimando os jovens. Posto em contraste, entre o desânimo ínsito no preâmbulo e o ânimo inscrito na mensagem, pareceria que o primeiro é para esquecer e apagar. A resposta a seu tempo esclarecerá o enigma.

Esgotado este tema importa agora entrar na segunda parte do preâmbulo que se esgota em profundas lucubrações e inexgotáveis explicações sobre a junção ou disjunção dos signos desporto e juventude, o que justifica a dificuldade criativa em abordar temas outros não sistémicos, ou não dispondo do tempo necessário para o efeito, exaurindo e debatendo o desnecessário e supérfluo, como se estivesse no lugar de Lúcio Séneca escrevendo as “Cartas a Lucílio”, para podermos interpretar o pensamento do interlocutor, como desvenda Michel Foucault no pequeno mas elucidativo “O que é um autor?”.

Um normativo jurídico funciona, à semelhança das Mensagens, como uma confissão, onde os movimentos da alma se exteriorizam, cunham e estampam, revelando ou desnudando o ideário, a ideologia ou até o imaginário do legífero, quando não transpiram ficção ou revelam sonhos. Isso resulta da inflação das normas, da flexibilidade das regras, e da complexidade dos sistemas jurídicos. Entre nós parece, no que ao Direito Desporto respeita, que a versatilidade e originalidade pertencerão ao campo do imaginário e que não terão lugar no seu campo, como seguidamente se demonstrará.

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