sábado, 30 de junho de 2012

Educação Física E Matrizes Curriculares – Tomada De Posição De Professores Catedráticos




Exmo Senhor
Ministro da Educação Prof. Doutor Nuno Crato
Excelência

A publicação do documento “Matrizes Curriculares dos Ensinos Básico e Secundário” suscita-nos a maior perplexidade, no que à disciplina de Educação Física diz respeito, dadas as suas implicações na formação e desenvolvimento harmonioso dos alunos e nas consequências que necessariamente terá na sociedade portuguesa.

Não se vislumbram razões de ordem pedagógica e científica nas medidas adoptadas. Pelo contrário, são decisões que contrariam não só recomendações de instituições internacionais credíveis (Comissão Europeia, Parlamento Europeu, Organização Mundial de Saúde, para citar apenas algumas), mas também a própria evidência científica.

Refira-se um exemplo:
Childhood is an important period to instil a preference for healthy behaviours, and to learn the life skills necessary to maintain a healthy lifestyle. Schools clearly play a crucial role in this respect. This is also an area where there is already firm evidence of the effectiveness of intervention: studies show that locally focussed actions, with very wide ownership, targeting 0-12 year olds will be effective in changing behaviour in the long run. Work should focus onnutrition education, and on physical activity. Health education and physical education areamong priority themes in the new Lifelong Learning Programme (2007-2013)(In, White Paper “A Strategy for Europe on Nutrition, Overweight and Obesity related health issues”, 2007,Commission of the European Communities, 2007, pag. 8).

As chamadas de atenção da parte da Comissão Europeia foram feitas considerando que:

1) Estão muito bem documentados os benefícios para a saúde da prática das actividades físicas e desportivas na infância, na adolescência e na idade adulta.

2) É muito preocupante a percentagem de crianças e jovens que apresenta baixos níveis de actividade física. A situação apresenta-se particularmente grave nas raparigas, nas crianças e jovens portadores de deficiência, e nos alunos oriundos de famílias com fracos recursos económicos.

3) É cada vez maior o número de crianças e jovens com excesso de peso e obesidade, como resultado de uma dieta inadequada, ou pouco variada, e reduzida actividade física.

4) As crianças e jovens sedentários estão mais predispostos a converterem-se em adultos inactivos.

5) Reconhece-se não ser possível resolver o problema do sedentarismo e da obesidade nas crianças e jovens sem o contributo da Escola e da Educação Física.

Acontece que, infelizmente, Portugal está entre os Países com taxas mais elevadas de sedentarismo e obesidade entre a população infantil e juvenil. Assim, torna-se totalmente incompreensível a decisão de reduzir a carga horária da disciplina de Educação Física no 3º ciclo e no ensino secundário, ou deixá-la à decisão última das Escolas.

Procurar solucionar o fraco rendimento escolar dos estudantes portugueses, em algumas áreas disciplinares, à custa da redução do tempo lectivo atribuído à Educação Física, é um preconceito que não tem qualquer sustentação científica, e que terá necessariamente efeitos perversos no desenvolvimento harmonioso da população escolar e agravará os custos do país com a saúde pública.

A decisão do Ministério da Educação e Ciência de reduzir a carga horária da Educação Física ocorre, paradoxalmente, quando um número crescente de estudos tem vindo a demonstrar que:

1) A prática estruturada da actividade física e do desporto, na Escola, exerce uma influência positiva no comportamento, na atenção, na aprendizagem e no rendimento escolar dos alunos.

2) O rendimento escolar é mantido, e algumas vezes aumentado, quando existe um incremento dos níveis de actividade física formal na Escola, situação que se verifica mesmo nos casos em que há uma redução do tempo curricular ou do tempo livre dedicado ao estudo de conteúdos predominantemente cognitivos.

Reduzir a carga horária da Educação Física não tem como consequência apenas privar a população escolar de uma parte da actividade física a que tem direito e necessita para o seu pleno desenvolvimento. É limitar significativamente a oportunidade de todas as crianças e adolescentes adquirirem os conhecimentos e desenvolverem as atitudes e competências necessárias para uma participação emancipada, satisfatória, consciente e prolongada na cultura do movimento ao longo de toda a vida. Significa ainda desvalorizar, perante a sociedade em geral, a importância de uma prática regular das actividades físicas e desportivas e a responsabilidade de cada cidadão assumir um estilo vida activo e saudável.

As reformas educativas (e curriculares) só ganham verdadeiro significado pedagógico e social quando contribuem para melhorar a formação daqueles que frequentam o sistema educativo, beneficiando a sociedade no seu conjunto. Não se conseguem apreender os benefícios que resultarão para os alunos e o país da concretização das medidas constantes no documento “Matrizes Curriculares dos Ensinos Básico e Secundário”.

Se por hipótese, com a publicação do documento “Matrizes Curriculares dos Ensinos Básico e Secundário”, o Ministério da Educação e Ciência pretende alcançar objectivos que nada têm a ver com a formação da população escolar, então V. Exª tem o dever ético de os dar a conhecer à população portuguesa.

Nem a actual situação de crise financeira e económica justificam tal medida; há já algum tempo que estudos de organismos internacionais concluíram que o investimento em Educação Física e Desporto representa a melhor poupança nos gastos com a saúde.

Na expectativa de que não deixará de reconsiderar a decisão tomada, colocamo-nos à disposição de V. Exª, e do Ministério da Educação e Ciência, para os esclarecimentos que possa entender úteis.

Com os melhores cumprimentos,
  1. António Manuel Fonseca, Prof. Catedrático, Universidade do Porto afonseca@fade.up.pt
  2. António Marques, Prof. Catedrático, Universidade do Porto amarques@reit.up.pt
  3. António Rosado, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa arosado@fmh.utl.pt
  4. António Veloso ,Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa apveloso@fmh.utl.pt
  5. Carlos Ferreira Neto, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa cneto@fmh.utl.pt
  6. Francisco Bessone Alves, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa falves@fmh.utl.pt
  7. Francisco Carreiro da Costa, Prof. Catedrático, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologiasfcarreiro.costa@gmail.com
  8. Francisco Sobral Leal, Prof. Catedrático, Instituto Superior Dom Afonso III fjsobral@gmail.com
  9. João Abrantes, Prof. Catedrático, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologiasjoao.mcs.abrantes@ulusofona.pt
  10. João Barreiros, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa jbarreiros@fmh.utl.pt
  11. João Paulo Vilas-Boas, Prof. Catedrático, Universidade do Porto jpvb@fade.up.pt
  12. Jorge Bento, Prof. Catedrático, Universidade do Porto jbento@fade.up.pt
  13. Jorge Ferreira Crespo, Prof. Catedrático, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias
  14. Jorge Mota, Prof. Catedrático, Universidade do Porto jmota@fade.up.pt
  15. Jorge Proença Martins, Prof. Catedrático, Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias defdl@ulusofona.pt
  16. José Alberto Ramos Duarte, Prof. Catedrático, Universidade do Porto jarduarte@fade.up.pt
  17. José Alves Diniz, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa JADiniz@fmh.utl.pt
  18. José Gomes Pereira, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa jgpereira@fmh.utl.pt
  19. José Maia, Prof. Catedrático, Universidade do Porto jmaia@fade.up.pt
  20. José Soares, Prof. Catedrático, Universidade do Porto jmsoares@fade.up.pt
  21. Leonor Moniz Pereira, Profª. Catedrática, Universidade Técnica de Lisboa lmpereira@fmh.utl.pt
  22. Luís Bettencourt Sardinha, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa lsardinha@fmh.utl.pt
  23. Pedro Cordeiro Sarmento, Prof. Catedrático, Universidade Lusíada pacsarmento@hotmail.com
  24. Pedro Teixeira, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa pteixeira@fmh.utl.pt
  25. Rui Proença Garcia, Prof. Catedrático, Universidade do Porto rgarcia@fade.up.pt
  26. Sidónio Serpa, Prof. Catedrático, Universidade Técnica de Lisboa sserpa@fmh.utl.pt

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