terça-feira, 28 de agosto de 2012

As palavras de um jovem campeão português, as certezas da juventude


Vasco Ribeiro: “É sempre um orgulho ser apontado como o sucessor do Saca”

Nascido no seio de uma família de surfistas, desde cedo Vasco Ribeiro criou laços com o mar e aos 17 anos já é uma promessa no mundo do surf.

Com o talento e a capacidade de trabalho de Vasco Ribeiro, não tardou a que o jovem da praia da Poça, S. João do Estoril, se tornasse a mais recente esperança no mundo do surf. Com um vasto currículo desportivo, Vasquinho, como é conhecido no meio, foi campeão nacional de surf e lidera, neste momento, a Liga MEO Pro Surf 2012, tendo também conquistado o 5.º lugar numa etapa realizada na África do Sul para o circuito mundial. Vasco conta ao i como foi que a sua carreira começou e revela- -nos as suas ambições para o futuro.

Como é que o surf começou?

Tudo começou mais ou menos aos seis, sete anos, aqui mesmo na praia da Poça, com o meu pai. Na altura ele fazia surf, hoje em dia ainda faz, e eu decidi experimentar. Desde aí comecei a fazer surf aqui. Ia para a escola e, quando voltava, praticava. Fui começando a gostar mais e mais. Desde aí, nunca mais parei.

Quando é que se apercebeu de que queria seguir carreira nesta modalidade?

Quando comecei a participar em alguns campeonatos e a viajar. Do que mais gostei, e ainda gosto, foi de viajar para os campeonatos, de ir lá para fora, competir e conhecer outros sítios. Acho que foi nessa altura que me apercebi de que era isso que queria fazer e fiz tudo por tudo para o conseguir.

As viagens começaram a ser feitas com a família?

Não. Apesar de ter começado a competir fora do país por volta dos 12 anos, sempre que fui para fora foram os meus treinadores que me acompanharam; aliás, é com eles que vou quase sempre. No entanto, a minha família, agora, também já começa a acompanhar-me.

O que é que os seus pais acharam da opção? Apoiaram?

Apoiaram-me. Eles apoiam-me em todas as decisões. Os meus pais percebem porque sempre fizeram surf. Embora a minha mãe tenha deixado, continua a adorar. Por isso, sempre tive o apoio da família.

Estuda?

Não, parei no 11.º ano.

Os estudos são para continuar?

Por agora, não. Vou parar dois ou três anos para pensar no que posso fazer, porque se for para seguir carreira no surf tem de ser agora. Claro que a escola é uma prioridade e quero acabar.

Gostaria de ingressar no ensino superior?

Sim, não sei bem como, mas quando acabar o liceu vou querer ir para a universidade. Gostaria de ir para Desporto.

Acha que vai dar para conciliar a exigência da sua carreira com o curso universitário?

Não sei, mas sei que não vai ser fácil. Quem sabe se não vou deixar de surfar. Oxalá que não (risos).

Como vê a carreira de surfista profissional face à crise, uma vez que as marcas também foram afectadas? É algo que o preocupa?

As marcas, de facto, começaram a sentir isso, claro. Mas a Quiksilver está bem no meio desta crise toda. Sou patrocinado pela Quiksilver Portugal e tenho o seu apoio, mas grande parte vem lá de fora, o que acaba por ser mais fácil. Mesmo assim, acho que as marcas de surf até estão a conseguir superar bem. As pessoas continuam a comprar fatos e acessórios de surf e, pelo que sei – que também gosto de manter informado –, acho que está a correr bem.

Quais são as características que um surfista profissional deve ter para alcançar o sucesso?

Deve treinar muito, surfar, ter cuidado com a alimentação, não sair à noite… e muita força de vontade.

Não sair à noite?

Sim, uma saída à noite pode estragar uma semana inteira de treinos.

Por falar em treino, como se prepara?

Depende. Nesta altura que tenho muitos campeonatos, é só mais mar, mas sempre que tenho intervalos entre as competições faço natação, ginásio, corrida. No início do ano faço mais ginásio.

Há alguma manobra favorita?

Tubos.

E onda?

Onda… não sei. Ondas há bastantes. Já surfei ondas bastantes boas, mas acho que a minha preferida continua ser aqui [praia da Poça], porque é onde me sinto melhor, estou com a minha família e com os meus amigos. Pode não ser a melhor onda, mas é o sítio mais giro.

Qual foi a sensação de fazer um 10 no Billabong J-Bay numa etapa que ainda no ano passado fazia parte do World Tour?

Foi muito bom. Já lá tinha surfado naquela onda e o campeonato teve seis dias de ondas perfeitas. É muito difícil apanhar ondas boas porque têm sempre imensa gente. Foi, sem dúvida, o melhor campeonato da minha vida. Quando apanhei aquela onda – naquela altura não houve tempo para pensar –, surfei e as coisas correram bem. Não sabia que ia ser 10, mas sabia que ia ter uma nota muito alta.

Foi a primeira vez que recebeu um 10 directamente?

Não, já tinha recebido alguns 10, mas num campeonato assim foi a primeira vez.

O que é que o inspira?

Ver os outros a surfar… ver os que surfam melhor do que eu, ir lá para dentro e tentar superar o meu nível, dar o meu melhor e fazer coisas novas.

Como é estar dentro de água?

Sinto que me esqueço de tudo, das coisas todas cá de fora. É como se estivesse só em harmonia com o mar.

Alcança o que se chama paz de espírito…

Exactamente.

E tubarões?

É sempre uma coisa complicada. Na África do Sul há imensos, também na Austrália. Uma pessoa tenta não pensar.

O que aconteceria se aparecesse um?

Já vi duas vezes. Uma pessoa não tem reacção. Estamos dentro de água e tudo pode acontecer. É preciso manter a calma e tentar surfar. Mas às vezes é complicado, certos sítios são complicados, mas não vou deixar de surfar por isso.

Como é surfar entre os melhores do mundo?

É muito bom, uma pessoa está sempre a aprender. Vejo o que eles fazem, tento fazer como eles e tento evoluir.

Há algum surfista que admire em particular?

Não sei… Se calhar acabo por admirar mais o Kelly Slater por ser mais velho, consegue habituar-se a todas as gerações. Considero que é o surfista mais completo e acaba por surpreender tudo e todos. Mas a nível dos mais novos, tenho vários: Julian Wilson, o Medina. São surfistas que olho para eles e penso fazer como eles, porque são os melhores.

Houve algum adversário que foi o mais difícil ou são todos difíceis à sua maneira?

São todos difíceis à sua maneira. Uns numas condições mais do que outros.

Como é a relação com o Frederico Morais?

Somos os melhores amigos. Sempre que viajo para fora acabo por viajar com ele, moramos quase um ao lado do outro, portanto é uma boa relação.

Como é competir directamente contra ele?

Às vezes é complicado, é com quem gosto menos de competir. Não gosto de competir com amigos, mas é o nosso trabalho e conseguimos separar bem isso.

No ano passado esteve quase a alcançar o título europeu Pro Júnior e este ano foi vice-campeão. O que faltou para alcançar o título?

Acho que foi ter faltado àquela etapa durante o Billabong J-Bay, mas sinceramente não me arrependo nada de não ter ganho. Prefiro de longe ter ido a J-Bay e ter feito aquele 10 e fazer aquele campeonato do que propriamente ganhar o título de campeão europeu.

E isso agora é uma coisa que o preocupa ou está mais concentrado em renovar o título de campeão nacional?

Não. Agora acho que é para continuar a treinar e começar a fazer o WQS (World Qualifying Series). O título nacional é sempre uma coisa boa, gostaria de revalidar, mas neste momento ficou para segundo plano.

Os meios de comunicação já o consideram o sucessor do Saca. É algo que o preocupa?

Não. Claro que é sempre uma pressão, mais nos campeonatos nacionais, mas consigo viver bem com isso. É sempre um orgulho ser apontado como o sucessor do Saca, já que é o melhor surfista nacional. Tento dar o meu melhor.

Gostava de competir com ele no World Tour?

Claro que era sempre bom competir contra o melhor surfista português, um grande orgulho e uma oportunidade. Há-de chegar esse dia.

Gostaria de receber um wildcard (convite) para competir no Rip Curl Pro Peniche?

Era, sem dúvida, quase um sonho realizado. Seria muito bom fazer uma etapa de WCT (World Championship Tour) em Portugal, era óptimo. Mas é muito difícil porque é um campeonato da Rip Curl, por isso tenho de refazer os trials (provas de acesso), tentar ganhar e ter oportunidade de entrar.

Há uns anos, o surfista era identificado como aquela pessoa que vestia roupas de marca de surf, usava cabelo louro, etc. Identifica-se com este estereótipo?

Não, porque a roupa de marca que uso tem de ser da Quiksilver. Se for nesse aspecto, até me identifico, porque é quase uma obrigação. Mas, de resto, acho que já passou um bocado a moda. Hoje até é mais normal usar o cabelo mais curto para não fazer tanta confusão.

Ainda existe a moda do parecer surfista ou isso já deixou de existir? Quem é surfista é porque realmente gosta?

Temos as duas coisas. Há sempre aquelas pessoas que querem mesmo ser surfistas e dão o seu melhor. E depois também há aquelas pessoas que levam a prancha para a praia só para mostrar às miúdas e acham que é giro ser surfista. Acho que vai sempre continuar a haver, mas dá para diferenciar bem.

O reggae está muito associado ao surf. Concorda?

Concordo. Pessoalmente não gosto, mas acho que está bastante ligado. Há cantores de reggae que são bons surfistas.

Sobre a polémica do Ericeira Surf Camp (espaço expropriado pela autarquia), qual é a sua posição sobre o assunto?

Acho que é uma pena, porque adoro aquele espaço. É um espaço que faz parte da Ribeira D’Ilhas. Sinceramente não sei muito bem o que se está a passar. As pizas são óptimas, o bar bom, e as pessoas adoram aquele espaço que faz parte da Ribeira D’Ilhas.

Muitos surfistas fazem outras actividades. O Kelly Slater, por exemplo, joga golfe. Como se entretém nos tempos livres?

Nada de especial. Costumo ler, principalmente em viagem, corro de vez em quando (risos), estou com os meus amigos, vou ao cinema.

Qual é a próxima paragem?

Vou para Espanha, depois sigo para os Açores, depois França, Bali, etc.

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